sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Agrotóxicos, histórico e novidades, Parte 1/3, artigo de Roberto Naime


[EcoDebate] BORSÓI et. al. (2014) assinalam que o meio ambiente envolve todos os seres vivos e inanimados que ocorrem na Terra, ou alguma região dela, que afetam os ecossistemas e a vida.

É compreendido pelo conjunto de condições, leis, influências e infraestrutura de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

A relação entre meio ambiente e agrotóxicos é extremamente complexa, pois todo produto químico aplicado no ambiente resultará em algum impacto, segundo BORSÓI et. al. (2014)

O Brasil é um dos principais consumidores de agrotóxicos do mundo, devido principalmente a sua grande extensão de terras agricultáveis e aplicações muitas vezes sem critérios técnicos que provocam contaminação do meio ambiente e interferem na saúde da população.

Dentre os agrotóxicos os grupos químicos organoclorados e organofosforados destacam-se pela alta toxidez de suas moléculas e capacidade de causar danos ao ambiente e, devido a serem aplicados em larga escala, provocam diversos problemas tanto a animais quanto a pessoas.

BORSÓI et. al. (2014) assinala que existem vários métodos e ações para reduzir a problemática da contaminação com agrotóxicos, entre as quais se pode citar o controle biológico de pragas e doenças, investimento em pesquisa em moléculas menos tóxicas e capacitação técnica para a correta aplicação dos produtos.

Não faz sentido exercer qualquer condenação prévia e apriorística de qualquer substância química, com apropriação dogmática. Qualquer inovação tecnológica tem como estimulação, os benefícios que podem ser gerados.

Assim, todos os procedimentos merecem isenção e avaliações em cada caso, e não condenações gerais de qualquer natureza, que respondam a anseios dogmáticos ou políticos.

Mesmo que não se apregoe qualquer restrição às evoluções científicas que inegavelmente são representadas por aprimoramentos de moléculas na indústria química, não custa nada admoestar a todas as partes interessadas que é preciso ter um pouco de humildade.

Mecanismos de proteção que podem até interferir na seleção natural, são temerários, sem compreender todas as relações implícitas ou explícitas, e não lineares ou cartesianas da homeostase dos ecossistemas.

Logo parece um pouco pretensioso na atual fase de conhecimentos da civilização humana, implementar estes incrementos sem considerar os princípios de precaução e sem mobilizar tentativas mais sistêmicas e holísticas de se apropriar da realidade.

A preocupação com a presença de agrotóxicos nos alimentos é tão antiga quanto à introdução destes produtos químicos no controle de pragas e doenças que afetam a produção agrícola.

A relação entre agricultura e saúde pública sempre foi muito grande, seja na função de supridora de alimentos, seja pelos riscos à saúde humana e ao meio ambiente causados pela utilização de agrotóxicos (VEIGA, 2007).

Apesar disso, somente em anos mais recentes, o avanço do conhecimento científico e as novas tecnologias da área laboratorial, vêm permitindo a avaliação da qualidade dos alimentos que chegam à mesa da população.

O desenvolvimento dos agrotóxicos foi impulsionado pelo anseio do homem em melhorar sua condição de vida, procurando aumentar a produção dos alimentos (BRAIBANTE e ZAPPE, 2012).

Mas agora é consensual a constatação de que a fome depende mais de equidade social na distribuição da renda do que da produção de grãos e alimentos

Os herbicidas que são amplamente utilizados em zonas rurais para fins agrícolas e não agrícolas, constituem importantes poluentes das águas naturais (IRACE-GUIGAND et al., 2004).

O círculo do agrotóxico ocorre quando um determinado produto é proibido de ser utilizado pelos produtores dos países industrializados, e entretanto continua sendo produzido nas indústrias deste país industrializado para ser exportado para nações em desenvolvimento. Onde são utilizados quase que inteiramente por produtores exportadores de grãos, e então o agrotóxico volta para o país industrializado como resíduo em alimentos (GALT, 2008).

Os resíduos de agrotóxicos em alimentos consumidos por pessoas podem ser causa de problemas endócrinos, uma vez que várias substâncias químicas de uso doméstico, industrial e agrícola possuem comprovada atividade hormonal, e por isso também são denominados interferentes ou disruptores endócrinos (FONTENELE et al., 2010).

Existem mais de três mil substâncias produzidas em larga escala no mundo e numerosas delas são interferentes endócrinos como inseticidas, detergentes, repelentes, desinfetantes, fragrâncias, solventes, retardantes de chamas, entre outros produtos, que estão presentes nos efluentes das indústrias e residências e que chegam até as estações de tratamento de água.

Deve-se considerar que apenas 40 a 50 substâncias químicas são contempladas pelos padrões de potabilidade de água na maioria dos países, e por isso a presença desses contaminantes na água, no solo ou no ar representa um risco devido à contaminação na cadeia alimentar, que não são avaliados pelos órgãos de controle de qualidade (FONTENELE et al., 2010).

Atualmente, mais de 80% dos agricultores brasileiros utilizam agrotóxicos para combater pragas e doenças e com isso aumentar a produtividade, o que contribui para aumentar o risco de danos ambientais e problemas com a saúde humana, uma vez que principalmente os agricultores estão expostos a uma mistura de agrotóxicos (PEDLOWSKI et al., 2012) e isso pode contribuir ainda mais para desencadear interferências endócrinas (FONTENELE et al., 2010).

Por isso, o ciclo dos agrotóxicos usados no mundo, considerando todo seu processo de produção industrial até seu destino final que é o meio ambiente, tornou-se praticamente uma preocupação constante entre os ambientalistas, ativistas políticos e pessoas preocupadas com qualidade e segurança alimentar do consumidor (GALT, 2008).

Para FIGUEIREDO e NETO (2009), extrapolar o conceito biológico tradicional de meio ambiente é necessário para que compreender a complexa relação entre ser humano e natureza. Subjetivamente, ambiente é um sistema de relações entre o ser humano e o meio, entre sujeitos e objetos.

O meio ambiente depende de um sistema de crenças, valores e culturas e da interação entre os sujeitos (indivíduos, grupos, sociedade) e os objetos (fauna, flora, solo, água, ar etc.).

Para BORSÓI et. al. (2014), dessa forma, é possível se ter então um conceito de meio ambiente, incluindo as percepções ambientais da sociedade, como o lugar determinado ou percebido, onde os elementos naturais e sociais estão em relações dinâmicas e em interação.

Essas relações implicam processos de criação cultural e tecnológica e processos históricos e sociais de transformação do meio natural e construído (FIGUEIREDO e NETO, 2009).

Houve grande transformação da paisagem do meio agrícola a partir da revolução verde, a qual provocou inovações com a utilização de tecnologias.

As tecnologias resultaram na substituição da mão de obra humana e animal pela utilização de máquinas e equipamentos, na utilização de sementes selecionadas para maior produtividade e recentemente pela adoção das sementes transgênicas.

Também resultou na intensiva utilização da adubação química e de agrotóxicos. Esse conjunto de inovações tem contribuído para modernas práticas agrícolas que garantem a produção de alimentos e cereais pelo aumento da produtividade agrícola.

Mas estas realidades não passaram nem perto de solucionar o problema da fome que depende da distribuição de riqueza.

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Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
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